Ruy Castro
Prestígio na literatura

 

Seus lançamentos sempre causam alvoroço no mercado editorial e são recebidos com entusiasmo tanto pelo público leitor quanto pela crítica. Ruy Castro é considerado, merecidamente, uma fera para escrever livros biográficos e históricos. Entre várias obras publicadas, Chega de saudade – As histórias e a história da Bossa Nova; O anjo pornográfico – A vida de Nelson Rodrigues; Estrela solitária – Um brasileiro chamado Garrincha; e Carmen – A vida de Carmen Miranda são bons exemplos desse talento. Detalhista ao extremo e obsessivo pela verdade, o autor realiza extensas pesquisas e entrevistas com pessoas que presenciaram fatos, reconstituindo não apenas a vida dos personagens como o contexto e os costumes da época.

Formado em Ciências Sociais em 1971, Ruy Castro confessa ter sido um péssimo aluno na faculdade, pois desde o primeiro ano já trabalhava em jornais. Era repórter e, envolvido pelos acontecimentos da então conturbada política brasileira, em meio à ditadura militar e aos movimentos estudantis, nem sabe como concluiu o curso. Atuou em praticamente todos os veículos importantes da imprensa do Rio de Janeiro e de São Paulo, como Correio da Manhã, Manchete, O Pasquim, Seleções do Reader’s Digest, Jornal do Brasil, TV Globo, IstoÉ, Playboy, Status, Veja, Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo.

Tornar-se escritor não era uma meta, simplesmente aconteceu. "Um dia, em 1988, tive a idéia de contar a história da Bossa Nova e vi que ela só caberia num livro", conta. "Dois anos depois, Chega de saudade estava nas ruas. A esta altura, eu já tinha proposto ao meu editor escrever a história de Nelson Rodrigues e, daí a dois anos, O anjo pornográfico também saiu. Assim tiveram início os meus livros, que continuam até hoje."

A escolha dos temas e a preferência pelas biografias não foram planejadas, segundo afirma. "Não sou eu que os escolho, eles é que me escolhem... Eu tinha uma paixão literária por Nelson Rodrigues e muita vontade de saber mais sobre sua vida. A maneira de saciar essa curiosidade foi escrevendo sua história. Depois, decidi escrever sobre alcoolismo e, na busca de alguém que pudesse ser meu fio condutor, a figura do Garrincha piscou na minha cabeça. Quanto à Carmen, ela praticamente se impôs sozinha diante de mim, como se dissesse: Vamos lá, Ruy, agora é a minha vez, você vai contar a minha vida! Despache-se!"

Para ele, o processo de criação desse gênero é extremamente trabalhoso: "Sempre me proponho a estabelecer contato e conversar com o maior número possível de pessoas que conviveram com os personagens. A grande dificuldade é a localização das fontes. No caso de Carmen, então, parecia impossível – todos os potenciais entrevistados já teriam mais de 80 anos. Mas consegui localizar dezenas deles."

"Por outro lado, os encantos de fazer uma biografia são infinitos", enfatiza. "Ao escolher alguém para biografar, parto de uma admiração pela sua obra e uma grande curiosidade sobre sua vida. Durante o processo, descubro tantas coisas sobre meu protagonista que posso tanto me decepcionar com algumas passagens do comportamento dele quanto me empolgar cada vez mais. Às vezes, e por mais contraditório que pareça, as duas coisas acontecem. Todo mundo tem defeitos e qualidades, mas só as pessoas excepcionais têm defeitos e qualidades excepcionais. É impossível não se envolver emocionalmente com o personagem. No caso de Carmen, sendo ela mulher e eu homem, houve uma paixão quase física da minha parte. O importante é que essa empolgação não comprometa a honestidade e a objetividade do biógrafo."

Natural de Caratinga, Minas Gerais, ele tem o dom de descrever o Rio de Janeiro como poucos, com grande paixão. "Se eu disser que sou mineiro, estarei me igualando aos verdadeiros mineiros que não apenas nasceram lá, mas levaram Minas Gerais dentro deles a vida inteira. No meu caso, quando nasci, em fevereiro de 1948, eu tinha uns 50 parentes no Rio de Janeiro e dois em Caratinga: meu pai e minha mãe, que tinham acabado de se mudar do Rio para lá a trabalho. Minha infância foi dividida entre as duas cidades até meados dos anos 1960, quando vim de vez para o Rio. Ou seja, dos meus 59 anos, vivi mais de 50 aqui. Minha ligação com a cidade é visceral – basta ler meu livro Carnaval no fogo para perceber. É uma declaração de amor, de gratidão e de entrega."

Caminhar pela cidade com a sua mulher, a escritora Heloisa Seixas, é um passatempo sagrado para Ruy Castro, que tem um cotidiano intenso. No momento, ele escreve uma coluna três vezes por semana na Folha de S. Paulo e grava uma coluna eletrônica diária na Band News TV, além de outras colaborações para a imprensa. Acabou de lançar Tempestade de ritmos – Jazz e música popular no século XX, uma coletânea de artigos sobre música, e está finalizando um novo romance, que deve sair ainda neste ano. Ler, para ele, é essencial: "Não faço outra coisa há exatamente 55 anos, desde que aprendi. Já li muita ficção – os franceses e ingleses dos últimos 300 anos e os americanos, russos, portugueses e brasileiros dos últimos 200. E poesia, dos gregos para cá, o que foi possível. Hoje leio basicamente biografia e história – sou fã de Robert Danton e da falecida Barbara Tuchman."

Sua relação com a Livraria Cultura vem de longa data: "Quando trabalhei em São Paulo, de 1979 a 1995, nunca deixei de freqüentá-la. Acho que, comprando livros, já deixei na Cultura o equivalente ao valor de um apartamento – mas, com esses livros, ganhei dinheiro para comprar pelo menos dois. Valeu a pena! A Livraria Cultura é inacreditavelmente completa e variada. Sem dúvida, uma livraria de primeiríssimo mundo. Vou sempre que estou em São Paulo. Se há um lugar onde eu me sinta em casa, nessa cidade, é na loja do Conjunto Nacional. Quando é que o Pedro vai abrir uma filial no Rio?"